Às margens de um pesadelo, afastei-me, forçando o despertar com o rosto sobre o travesseiro enxugando o desespero. Não eram atos, naquele sonho, eram sentidos: vários deles congestionados e bagunçados, interpolando, oscilando entre a lucidez e a loucura, mantendo-me recuado no canto da fadiga. Não era medo que me atormentava, era a sensação de mastigar cascas de ovo, como se numa bocarra, entranhasse os dentes no próprio coração desidratado pela mágoa, seco, pálido e feito de areia. Ao levantar me vejo recepcionado por um sádico silêncio forjado pelas paredes e, mais uma vez, encontrei-me ausente de qualquer amparo.
O tal sonho:
O meu mar era feito de pedras, escombros de pássaros mortos, navegava sobre um corpo almejado pelo sucinto desejo da inexistência. Afrontando os vestígios de martírios, deslizava entre larvas e moscas, zurzindo a respiração. Estreitando a visão às lentas, um estertor me causava embriaguez. Assistia, voando sobre meu cadáver, a um anjo negro de asado vermelho café, sacudindo pelo pairar um perfume ungido pelos desgraçados. Intangível pela narina, tangível pela pele: queimando a nesga dos dedos, germinando na boca sabores denso, estremecido e nauseativo, numa expectativa contundente ao qual se refere o aluir da minha sobrevivência, eu me perdia.
Não era morrer, era transformar-se.
Não era decompor, era sublimar-se.
PR
14 julho 2009
O mais belo sonho
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estou tão cansado, não triste. é cansaço...
ResponderExcluir“O que há em mim é sobretudo cansaço – Não disto nem daquilo. Nem se quer de tudo ou de nada: Cansaço assim mesmo, ele mesmo. Cansaço. A sutileza das sensações inúteis. As paixões violentas por coisa nenhuma. Os amores intensos por o suposto em alguém. Essas coisas todas –Essas e o que falta nelas eternamente – : Tudo isso faz um cansaço. Este cansaço, cansaço.
ResponderExcluirHá sem dúvidas quem ame o infinito. Há sem dúvidas quem deseje o impossível. Há sem dúvidas quem não queira nada –Três tipos de idealistas, e eu nenhum deles: Porque eu amo infinitamente o finito. Porque eu desejo impossivelmente o possível. Porque eu quero tudo, ou um pouco mais, se puder ser, ou até se não puder ser... E o resultado? Para eles a vida vivida ou sonhada. Para eles o sonho sonhado ou vivido. Para eles a média entre tudo e nada, isto é, isto... Para mim só um grande, um profundo, e, ah com que felicidade infecundo, cansaço. Um supremíssimo cansaço. Íssimo, íssimo, íssimo. Cansaço...
(Álvaro de Campos) Fernando Pessoa.
Sensação ao final: tão diferente que nem tenho adjetivos (olha que isso é difícil). Isso quer dizer que eu vou voltar mais vezes ^^
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